FOUCAULT - Corpos dóceis e úteis


O poder como fator preponderante da docilidade humana
Uma visita à Foucault em Vigiar e Punir[1]

Ari monteiro[2]

Nessa humanidade central e centralizada, efeito e instrumento de complexas relações de poder, corpos e forças submetidos por múltiplo dispositivos de "encarceramento", objetos para  discursos que são eles mesmos elementos dessa estratégia, temos que ouvir o ronco surdo da batalha.(FOUCAULT)


Resumo:  A partir da obra Vigiar e Punir tecer reflexão sobre o poder e a dominação, levando em consideração o capitulo terceiro da obra.


Palavras Chave: Poder, dominação, docilidade, utilidade.



Muito mais que a historia do nascimento da prisão, Vigiar e Punir é a história das técnicas de condicionamento do corpo para o domino e submissão ao poder. A mudança de referencias, onde de inicio o suplicio e o castigo eram espetáculo para o povo, a tortura pública usada como demonstração de que os “inimigos” eram barbaramente punidos e que o poder deveria ser obedecido, foram aos poucos, ao longo do tempo, adquirindo formas mais “civilizadas” de punição, e nesse processo o corpo é (foi) a unidade onde todas as técnicas foram aplicadas e desenvolvidas. “Um saber, técnicas, discursos “científicos” se formam e se entrelaçam com a prática do poder de punir.”(FOUCAULT,pg. 26, 2004).
            O aparato que se desenvolvia encontrou no corpo seu objeto de punição para que pudesse cumprir a “meta”, de acabar com a barbárie e civilizar o castigo, necessário criar corpos dóceis e que fossem de utilidade, pois tarefas “sociais” deveriam ser executadas por esses corpos, então o homem submetido, cumpria o ordenado sem que as ordens fossem questionadas ou criticadas. A disciplina entra em cena como “ferramenta” para criar a docilidade e utilidade dos corpos. “É dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado.” (idem,pg. 117)
Com a disciplina usada para o adestramento, o controle do espaço e do tempo foram largamente utilizados, a criação de lugares para que  a vigilância fosse executada de maneira civilizada, porém constante e efetiva, a correção de alguma “anomalia” se torna mais fácil quando se está perto para aplicação do castigo, e mais eficiente se for aplicado ao corpo que está ao alcance e será exemplarmente demonstrado, pois o espaço de relacionamento foi pensado para exercer tal função.O tempo controlado não permite o ócio ou a negação do cumprimento do que foi estabelecido como tarefa, logo a utilidade se efetiva quando os corpos cumprem as determinações do poder.Controla-se então o corpo e a alma do homem, sua condição não é de escravo, nem de vassalo (as relações são outras), mas são de corpos treinados subliminarmente para a obediência das instituições e dos aparelhos detentores e fabricantes das disciplinas. “Trata-se de alguma maneira de uma microfísica do poder posta em jogo pelos aparelhos e instituições, mas cujo campo de validade se coloca de algum modo entre esses grandes funcionamentos e os próprios corpos com sua materialidade e suas forças.( ibidem,pg.29)
A construção dos locais, o quartel, a escola, o hospital, segundo modelo do Panóptico, arquitetura preparada para a vigilância constante, não foi mera coincidência mas um plano cruelmente calculado metro a metro para controle e a vigia  dos corpos pelo tempo em que sua presença fosse necessária (ou obrigatória) no local. Os agentes executores – também treinados – desenvolvem sua utilidade no que diz respeito à efetivação do adestramente, a disciplina cumprida à risca é fator de primeira ordem para não se permitir desvios ou critica do sistema, as instituições patrocinadoras das técnicas não admitem “almas ruins”, todos sem exceção devem ser adestrados, dóceis e úteis,sendo assim a disciplina é imposta aos corpos de maneira a fazer com que a tortura não seja “sentida”, o domínio se faz imperceptível mas o poder se estabelece profunda e sorrateiramente. As técnicas e os discursos são apurados, são atualizados de maneira a cumprir a missão funesta e nenhuma instancia do corpo é esquecida, os valores morais reforçam o condicionamento e as instituições criam, aplicam e fornecem manutenção ao sistema. 

Sobre essa realidade-referência, vários conceitos foram construídos e campos de análise foram demarcados: psique, subjetividade, personalidade, consciência, etc.; sobre ela técnicas e discursos científicos foram edificados; a partir dela. valorizaram-se as reivindicações morais do humanismo. Mas não devemos nos enganar: a alma, ilusão dos teólogos, não foi substituída por um homem real, objeto de saber, de reflexão filosófica ou de intervenção técnica. (ibdem pg.33)

            Vigiar e Punir é antes de tudo um texto para reflexão sobre os  valores criados e presentes no dia-a-dia de todos os corpos oprimidos, dilacerados, castigados por um sem número de prisões invisíveis, suplícios “civilizados” (ou civilizadores?), técnicas que se modernizam, mas não perdem seu caráter de dominação. Foucault nos faz pensar em maneiras de fugir da docilidade, questionar nossa própria docilidade antes de olhar para a condição de dominado do outro, do vizinho, do corpo que não nos pertence, mas se aprofundar em nós mesmos, antes de olhar do lado ou à frente.











Referencias

FOUCAULT, M. Vigiar e Punir – Nascimento da Prisão. Petrópolis; Editora Vozes, 2004.


[1] Artigo Produzido para aprofundamento dos estudos de Foucault, grupo de estudos dirigido pela Pfra. Mestre Suze Piza.
[2] Licenciando em Filosofia pela UMESP.

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